sábado, 20 de março de 2010

AS GOTINHAS E A CEGUEIRA.

Lá vinha ele mais uma vez, indolente, folgado, dono de si, senhorita Ouro não conseguia fixar o botão que parava o ventilador, na verdade tinha forçado tanto o botão que esse já não funcionava mais, então o ventilador permanecia girando a 180º sem a menor pretensão de parar na posição correta para refrescar a moça.

- Droga de ar-condicionado quebrado, merda de ventilador que não para de girar, putz que calor! – reclamava ela.

A senhora Bronze ligara dizendo que chegaria atrasada, e havia pedido para Ouro adiar todas as reuniões que ela tivesse na parte da manhã.

Enquanto isso naquele calor insuportável que fazia no 13º andar daquele prédio comercial, gotinhas de suor se divertiam brincando, escorregando pelo corpo torneado da senhorita Ouro, para elas a senhorita era um parque de diversões, visão também compartilhada pelo namorado dela, um tobogã cheio de curvas insinuantes, provocantes e perigosas.

O cara que consertava o ar-condicionado tinha chegado, ela havia ligado há 30 minutos, é já estava impaciente, mas para o trânsito assombroso daquela cidade o senhor Prata tinha alcançado um tempo recorde ao atravessar a cidade em tão pouco tempo.

Eu vim dar uma olhada no ar-condicionado. Disse o senhor.

- Ah Ok, pode entrar o aparelho fica logo ali no canto da sala.

Prata entendia muito da sua função, era o melhor técnico em manutenção na sua empresa, anos e anos de experiência, e em menos de 25 minutos já havia identificado o problema.

- Já descobri o problema senhorita, tem uma peça que vou ter que trocar, mas para isso preciso levar o aparelho para a empresa.

- Ahh tudo bem – respondeu resignada Ouro – só que antes de você levar, abriu a gaveta e pegou uns papeis, você vai ter que entregar esse termo para passar pela portaria do prédio, para eles saberem que você está levando o aparelho para manutenção. Ahh você vai ter que assinar também, lá em baixo eles te explicam melhor.

- Tudo bem – disse Prata – mas eles têm tinta?

- Ahh sim eles devem ter caneta lá embaixo, com certeza.

- Não, não eu quero dizer tinta de carimbo, sabe como é ...hehe e apontou o Polegar para Ouro meio envergonhado.

- Ouro a princípio não entendeu, mas quando a ficha caiu, não passava por sua cabeça que ainda existiam pessoas que não soubessem escrever e disse constrangida: ahh entendi, espera um pouco que eu vou confirmar.

Fez a ligação para a portaria explicou a situação, e em pouco tempo ficou tudo resolvido então ela se despediu do senhor Prata que disse um até mais.

Depois que ele fechou a porta, a imagem dele mostrando o polegar não deixou sua cabeça. Enquanto Ouro ajeitava seus óculos naquele nariz naturalmente empinado, várias questões surgiram.

Como ele havia conseguido um emprego técnico? Se ele não sabia escrever provavelmente não saberia ler, será? Devia ganhar um salário ínfimo por causa dessa condição, pobre homem. Ela não conseguia se imaginar no lugar dele talvez se sentisse quase como uma pessoa cega, se não pudesse identificar ou reproduzir os sinais daquela sociedade.

Por alguns instantes Ouro se sentiu frustrada com aquela situação, mas então lembrou que tinha que marcar o cabeleireiro e manicure para a tarde, afinal era sexta feira dia de se divertir com o namorado. E uma questão mais importante se formou em sua mente. Será que consigo agendar horário para hoje? Tenho que me apressar.

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